Meio por acaso, no último domingo fui pela primeira vez ao recém inaugurado Museu da Rampa. Após um brunch com Nina e Márcia no Pé de Cajú, íamos à Pinacoteca para ver as exposições atuais, mas lembrei da possibilidade de ir ao novo museu localizado nas Rocas e assim acabamos lá.
*Área externa do Complexo Cultural Rampa [foto minha]*Em função do meu trabalho da formação continuada de professores de História da rede municipal de ensino, eu já estava querendo fazer uma visita ao equipamento.
A impressão geral foi positiva, mas destaco dois aspectos que me chamaram a atenção.
Primeiro, nas salas alusivas à participação de Natal na Segunda Guerra Mundial senti muita falta de mais particularidades do impacto da guerra no cotidiano da cidade. Com exceção de uma "sala do blackout", que tenta recriar a experiência dos cortes de eletricidade como estratégia de defesa, que ocorriam em Natal à época do conflito, não há nada mais significativo a respeito dos desdobramentos para os natalenses da presença americana na cidade, durante a guerra. Além disso, há um foco muito grande nos intinerários de Roosevelt, da saída da sua comitiva dos EUA, até a chegada em Natal.
O segundo ponto diz respeito ao acervo, que se resume a dois uniformes militares e alguns poucos documentos escritos como jornais e livretos publicados na Itália à época da presença da FEB naquele país.
Também saí com a impressão de que o espaço físico do museu está superdimensionado em relação ao acervo disponível. Exemplo disso é uma sala intermediária em que está esposta uma exposição bastante genérica com a temática da paz, que se resume a cartazes com citações que passam por Bob Marley e John Lennon e chegam à Madre Tereza de Calcutá.
Espero que na permanência de um acervo limitado no museu, essa sala seja utilizada para exposições temporárias mais relevantes.
Watched on Wednesday February 22, 2023.
Watched on Saturday February 11, 2023.
Watched on Monday February 20, 2023.
Desde o fim de janeiro venho jogando um novo save de The Legend Of Zelda Breath of The Wild e tem sido uma experiência incrível. Falo que estou em um novo save porque comecei no jogo em outubro de 2017, quando comprei o Nintendo Switch. Nessa primeira tentativa, dediquei mais de 120h, mas como as jogatinas foram espaçadas, acabei não indo até o fim, o que também se deve ao fato de à época eu ter retomado o hobby dos videogames e estar com muitos jogos na fila.
Lembro que quando peguei o atual console da Nintendo, meio que tinha estabelecido que jogaria um jogo por vez e não sairia comprando outros até que terminasse ou desistisse do que estivesse jogando no momento. Contudo, pouco tempo depois, me vi imerso na cultura dos videogames, sobretudo na sua faceta de colecionismo, e passei a comprar muitos jogos e consoles, o que, obviamente teve um impacto imediato no tamanho do meu backlog e, sobretudo, na forma como eu encarava as gameplays. De maneira geral eu estava jogando muita coisa com pressa, no intuito de passar para o próximo jogo da fila, o que acabava gerando alguma ansiedade em mim, além de me tolher a possibilidade de descobrir bons aspectos de alguns games, que só uma experiência sem pressa e atropelos é capaz de proporcional.
Foi mais ou menos o que aconteceu quando joguei Super Mario Odyssey, entre julho e agosto de 2018. A pressão pelos outros jogos já comprados me fez acelerar a jogatina em direção ao mínimo necessário para terminar o game, além de fugir dos aspectos mais colecionistas da obra, como completar as Power Moons.
Ainda que vez ou outra eu balance ao ver algum amiibo ou tenha aquela vontade repentina de voltar a comprar e empilhar na estante cópias físicas de alguns jogos, no fim de 2021 me desfiz da pequena coleção que acabei construindo e passei a ter uma relação mais minimalista com os games. E foi nesse contexto que eu embarquei numa nova jogatina de Zelda BOTW. Tenho me empolgado bastante e, certamente pela qualidade do design de mundo que a Nintendo imprimiu ao jogo, a vontade atual é de imergir e passar a maior parte do tempo possível em Hyrule. Ao contrário da minha primeira incursão, dessa vez tenho me motivado a fazer todas as side quests, além de explorado com calma e minúcia os diferentes lugares para onde o jogo me leva.
Além disso, essa tem sido uma experiência mais compartilhada com Nina, que chega a se irritar quando por ventura eu começo uma sessão de jogatina sem que ela esteja junto. Ela também tem um jogado um save próprio, mas faz questão de estar comigo quando jogo no meu. Naquela primeira vez que joguei, Nina também se interessava, mas ainda desacostumada ao controle de câmera em jogos 3D, não conseguia ir muito além. Dessa vez, tem sido muito bacana presenciar como ela tem lidado com desenvoltura, desde a destreza para os comandos, até a tradução de diálogos.
Watched on Sunday February 12, 2023.
Watched on Saturday February 11, 2023.
Recentemente estive ouvindo o clássico disco homônimo do General Junkie. Venho convivendo com esse álbum desde o seu lançamento, em 2002, mas o distanciamento tem me feito perceber algumas nuances até então ignoradas.
Apesar de lançado no início da primeira década dos anos 2000, o disco reuniu músicas que foram compostas ao longo dos anos 1990 e que carregavam marcas fortes daquele tempo, sobretudo no que diz respeito à mistura de ritmos e linguagens, tão próprias daquela década. Daí a comparação reiterada pela crítica musical local, do General com as bandas pernambucanas expoentes do Manguebeat, creio eu que sobretudo como consequência da proximidade dos natalenses com o Eddie, que chegou inclusive a gravar "O Amargo", composição de Gustavo Lamartine.
Contudo, considerando as óbvias diferenças estéticas, acredito que é possível situar as composições do General Junkie num movimento (espontâneo e sem manifesto) nacional mais amplo da música independente brasileira daquele período, que se se permitia ir além de algumas convenções estéticas tão caras aos anos 1980, e que colocaria a banda potiguar na mesma linha evolutiva da música brasileira que também abrigaria nomes como os cariocas Acabou La Tequila e Mulheres que Dizem Sim.
O General Junkie foi muito competente em dialogar com aquela tendência que acontecia na música brasileira da época, partindo do local, assumindo o sotaque natalense, e no caso das músicas registradas no disco, captando o que acontecia fora do Brasil, especialmente a rítmica do Rage Against The Machine e abordagem guitarrística de Tom Morello, conscientemente assimiladas pela banda, como Anderson Foca revelou no livro DoSol: 10 anos de música, e, mais recentemente, no podcast que o DoSol lançou para celebrar os 20 anos de atividades enquanto combo cultural.
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O fato é que Gustavo, Paulo e Marcelo lidaram com esse caldeirão de referências e chegaram a um disco cheio de personalidade e, mais importante, sem soar pastiche. Algo que eu certamente não consegui fazer com o República 5, a primeira banda em que toquei, nem com as primeiras composições que escrevi para o SeuZé.
O República 5 começou no final de 1999 e durou até o início de 2003, quando o SeuZé foi formado. Pelo menos entre o meu círculo de convivência, ainda era bastante forte o rescaldo cultural vindo dos anos 1990.
Quando escrevi as minhas primeiras músicas, acho que em 1998 ou 1999, eu e alguns amigos do Salesiano ouvíamos muito Nirvana, Engenheiros do Hawaii e Paralamas. Assim esses meus primeiros esforços de composição remetiam a essas bandas e de certa forma eram canções mais ortodoxas no sentido de serem mais diretas e não sugerirem misturas entre gêneros e ritmos. Em algumas dessas primeiras produções eu escrevia letra e música, mas era bem comum à época eu musicar letras de alguns colegas da escola, principalmente de Carlos Henrique com quem estudei até o terminarmos o Ensino Médio, em 2000.
Uma dessas parcerias deu origem à canção Quem Somos Nós, que originalmente foi pensada como um rock mais direto, bem na fonte dos Engenheiros, mas que quando trabalhada em ensaios pelo República 5, acabou ganhando uma pegada mais reggae, em grande parte por sugestão de Carlinhos, baterista da banda. Quem Somos Nós Chegou a ser registrada numa demo que a minha primeira banda gravou no Estúdio Cantus, capitaneado por Hélder Lima, à época baterista do Cantus do Mangue, banda de reggae seminal natalense. Essa gravação provavelmente foi feita em 2001 ou 2002, em dois canais. Posteriormente seria mixada por Rufino, um conhecido, numa sala do CEFET-RN.
Carlinhos, que além de baterista do República 5, era meu vizinho, era bastante curioso e tinha uma pegada de ouvir música com ouvido de pesquisador. Lembro que mais ou menos nessa época, num dia em que estávamos voltando da saudosa Velvet Discos para Lagoa Nova, bairro em que morávamos, ele me falou algo como:
Para quem tem banda, um disco é como um livro.
De fato, boa parte da tendência que desenvolvi nesses primeiros anos de bandas, de pensar em arranjos sempre considerando a possibilidade de misturar ritmos e linguagens, veio através de Carlinhos. Foi ele quem me apresentou os discos de Chico Science, o Guentando a Ôia - do Mundo Livre - e mais a frente, em 2002, o Alugam-se Asas Para o Carnaval, do Jorge Cabeleira. Esse último exerceu um forte impacto em mim e influenciou decisivamente a estética que as primeiras composições do SeuZé seguiram, baseada numa mistura de rock, blues e baião.
Acontece que a leitura que fiz de todas essas e bandas e discos foi, em alguma medida, ingênua e literal, como um Sérgio Leone sem intencionalidade e ironia. Ainda gosto de algumas ideias do Festival do Desconcerto, do SeuZé, sobretudo considerando que só pudemos contar com um produtor experiente na mixagem do disco. Mas comparando hoje com o disco do General Junkie, o de estreia do SeuZé me soa ligeiramente pastiche e apressado no trato com as referências. E ao refletir sobre isso não o faço em tom de lamento, arrependimento ou juízo de valor, mas como uma observação que só o distanciamento temporal pode produzir.
Watched on Monday January 30, 2023.
Desde o os últimos meses do ano passado tenho utilizado bastante o Mastodon como rede social. Segundo o print acima, criei um perfil na instância mastodon.social em 20 de fevereiro de 2020. Mas foi realmente com a bagunça no Twitter pós-Elon Musk que passei a ser mais assíduo por lá. Tem sido bem empolgante ver o aumento de usuários por la, o que pode ser mensurado pelo tempo que tenho levado para dar conta da minha timeline nas últimas semanas. Se antes desse movimento eu acessava o app oficial do Mastodonte no meu iPhone, normalmente uma vez ao dia, e lia todas as mensagens em menos de 10 minutos. Agora é algo que se eu repetir, vai me tomar perto de 1h.
O maior porém é que a maior parte dos perfis lusófonos/brasileiros que eu acompanho em outros lugares ainda não têm presença no Mastodonte, de forma que a maior parte da minha timeline é composta por estrangeiros, que em sua maioria são jornalistas de tecnologia e, mais especificamente, perfis que discutem ideias relativas a web aberta, indieweb e afins. Essas estão entre as temáticas que mais têm despertado a minha curiosidade desde pelo menos um ano, mas sinto falta de mais presença brasileira ou de pessoas mais próximas a mim por lá.
De toda forma, essa experiência tem evocado sensações e sentimentos que tive quando usei pelas primeiras vezes serviços como o mIRC, Orkut e as antigas plataformas de blogs do começo dos anos 2000. A ideia de estar desbravando algo novo através da Internet, com potencial para mudar de alguma maneira a forma como nos comunicamos.
Eis que ontem uma postagem de Anil Dash me chamou a atenção:
Com a diferença de que não estou cuidando de minucias como consertar links de cada post, Anil está envolvido num projeto semelhante ao que comentei no último texto que escrevi aqui no blog, de migrar todas as postagens de sites pessoais antigos meus para essa encarnação atual da qual escrevo. E nos comentários à mensagem dele, vários seguidores admitiam que estavam fazendo o mesmo. Pode parecer uma coisa ainda muito de nicho, mas é inegável que existe um movimento de retorno aos blogs pessoais que pode trazer novos sabores para essa Internet restrita às grandes redes sociais ao longo de, pelo menos, os últimos dez ou quinze anos.
Em tempo: concluí a migração das postagens dos meus blogs antigos que estavam acessíveis via Internet Archive. Conforme adiantei no último post, muita coisa que reencontrei não diz mais respeito ao que penso e, certamente, seria passível de cancelamento caso fosse escrito hoje em dia, seja por vieses racistas, machistas, misóginos, ou pela natureza dos meus interesses à época. Reencontrar com esses textos tem me feito cada vez mais confirmar a impressão de que o Felipe de 20, 20 e poucos anos, era muito mais próximo da sua versão adolescente/inconsequente, do que de uma versão adulta. De toda forma, mesmo assim quero ter esse histórico reunido no lugar em que escrevo atualmente.
Os próximos passos desse trabalho arqueológico serão organizar as tags e categorias e, caso eu tenha a paciência de Anil Dash, organizar a integridade dos links de todo o meu histórico de postagens.
Watched on Wednesday January 25, 2023.
Watched on Tuesday January 24, 2023.
Watched on Sunday January 22, 2023.
Watched on Sunday January 22, 2023.
2022 foi sem dúvidas um dos anos em que mais consumi conteúdo da web aberta, sobretudo blogs hospedados em servidores pessoais. Desde a primeira onda de weblogs, lá no início dos anos 2000, sempre nutri uma curiosidade e interesse sobre a possibilidade de publicar e ler impressões pessoais sobre o cotidiano e as pequenas obsessões individuais tão caras à blogosfera.
Após ter abandonado o meu perfil no Facebook (mantenho apenas uma página destinada a divulgar os meus trabalhos na música) e cada vez mais ter menos saco para ser ativo em redes como o Twitter e Instagram, recorrer à web aberta me pareceu um caminho legal de percorrer. Para acompanhar as dezenas de blogs pessoais pelos quais me interesso, uso o NetNewsWire, um agregador de feeds RSS que faz o mesmo papel do finado e saudoso Google Reader. Abaixo a lista de sites pessoais que estão no meu radar:
De fato essa sensação geral de saturação das redes sociais como conhecemos e, sobretudo, o caos que se instalou em torno do Twitter pós aquisição de Elon Musk, deu uma nova sobrevida aos blogs, a ponto de ser frequente o espaço em alguns veículos grandes como o The Verge, para textos que falam sobre o renascimento dos blogs.
Acompanhar de perto esse movimento teve efeito sobre esse espaço em que escrevo. 2022 foi ano em que mais escrevi por aqui desde que botei o Música em Versão Beta no ar. Também contribuiu para isso o fato de eu ter conhecido as ideias por trás da Indie Web e ter me convencido da importância de ter o meu espaço pessoal na Internet e ser dono do conteúdo que produzo.
Além de passar a postar com mais frequência, também me inspirei a organizar a parte estrutural deste blog. Tenho feito pequenos ajustes de design, além de despender um esforço arqueológico de trazer para cá postagens de outros blogs antigos que mantive no passado e mesmo de redes sociais como o Facebook. Nessa tarefa de lidar com o passado, corre-se o risco de reler a quantidade de besteira que um jovem adulto de 20 poucos anos era capaz de produzir com um teclado à mão e uma conexão discada à disposição. Muito do que escrevi nesses antigos espaços é bastante diferente da minha visão de mundo atual, e certamente seria motivo para o meu cancelamento em tempos atuais, mas estou fazendo questão de trazer para o histórico deste blog, justamente para que eu possa acompanhar esse caminho. Por outro lado, têm sido muito bacana reencontrar outros registros do início da minha trajetória como músico e compositor. Aqui, por exemplo, escrevo sobre a minha saída do República 5 e sobre a fundação do projeto que viria a ser o SeuZé. É um texto que foi escrito em 15 de setembro de 2003 e que, a despeito de estar cheio de erros gramaticais e ter sido produzido num estilo de escrita que hoje estranho, tem a sua importância de ser registrado.
Através do incrível WayBack Machine consegui resgatar o histórico dos Papo Passado e Cabaret de Luxo, blogs que mantive entre 2003 e 2005. Esses sites foram hospedados em servidores gratuitos de blogs que existiam à época, como o Blig, Weblogger e Blogspot. Só não consegui encontrar registros de um tempo em que o Papo Passado funcionava no Blogger.
Ainda estou trabalhando nas importações dessas postagens antigas, mas todas elas estarão reunidas aqui.
Watched on Thursday January 12, 2023.
Ontem fui à nova sede do DoSol para ver o show solo de Teago Oliveira. Venho acompanhando o trabalho dele enquanto compositor principalmente através da Maglore, banda que vem se tornando uma das mais sólidas e interessantes do país nos últimos tempos. A quantidade de grandes canções que eles conseguiram reunir nos últimos quatro discos - os que mais ouvi - é um caso raro no cancioneiro nacional, e fosse em outro momento do mercado fonográfico, certamente colocaria os baianos na mesma prateleira de gente como Los Hermanos e Legião Urbana.
O primeiro contato que tive com Teago e com a Maglore foi em 2011 ou 2012, quando eles vieram pela primeira vez a Natal, num show organizado pela antiga LoL Produções, de Thalys Belchior, em que o SeuZé tocou como banda de abertura. De lá pra cá eles vieram lançando discos novos com uma boa frequência, se mudaram para São Paulo e se tornaram uma das bandas mais relevantes do Brasil na atualidade.
O show de Teago reune músicas do disco solo Boa Sorte (2019), músicas lançadas pela Maglore e algumas versões para outros artistas feitas pelo compositor baiano, como a linda releitura para Exotérico, de Gil.
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Não foi intencional, mas em alguns momentos me vi assistindo ao show do ponto de vista de compositor. É muito interessante observar como em algumas composições mais recentes, Teago explora a tessitura gigante da sua voz e usa isso como recurso para criar dinâmicas e climas para muitas das suas músicas. É o caso de "Eles", que foi lançada em 2022 no disco V, da Maglore, que começa com um registro de voz mais grave e quando chega ao momento de dinâmica mais alta com o resto da banda, a voz passa para a região mais aguda, que Teago domina muito bem e imprime um timbre seguro, potente e delicado. Isso causa um impacto muito grande na versão gravada em estúdio, mas em um show solo tem um efeito ainda mais poderoso ao criar climas e nuances para uma apresentação que por natureza não tem tantas possibilidades de texturas e dinâmicas quanto um show com banda inteira. De certa forma me remete a outros cantautores que formatam as suas composições para ser executadas por apenas uma pessoa e também brincam bastante com essa relação entre a dinâmica e a tessitura da voz. Glenn Hansard, que ganhou o Óscar de Melhor Canção, em 2008, com Falling Slowly, composta em parceria com Markéta Irglová, fez muito isso em composições lançadas nos seus discos solo.
Voltando ao show de Teago, outra coisa que me chamou atenção pela forma como ele explora é o uso do reverb, sobretudo na guitarra, para preencher espaços e criar dinâmicas. Algo que só tem efeito prático com uma boa sonorização, o que a nova sede cultural do DoSol conseguiu oferecer já nesses primeiros meses de funcionamento. O som estava impecável e a nova sala para shows é uma conquista gigante para a cidade porque proporciona um formato de show que até então só era possível de forma mais improvisada.
Em 2015 eu fui ao show do Apanhador Só, pela turnê Na Sala de Estar, que a banda gaúcha viabilizou através de financiamento coletivo. Com o projeto no Catarse eles conseguiram comprar um carro e viajaram pelo país inteiro se apresentando em espaços como salas de estar das casas de fãs, nas cidades por onde passavam. Ao final da programação de apresentações a banda venderia o carro e investiria a grana na gravação de um próximo álbum. A princípio parecia uma ideia insustentável do ponto de vista do negócio, pois essas apresentações mais "domésticas" em tese não renderiam boas bilheterias, mas para bandas como o Apanhador Só, que já tinham uma base de fãs considerável, se mostrava extremamente viável. Pela possibilidade de um contato mais próximo e íntimo como o artista/banda, o público geralmente está disposto a pagar um pouco mais pelo ingresso, o que viabiliza a apresentação para os artistas e para os produtores locais. Essa é uma ideia que à época eu sabia que já era colocada em prática no circuito independente de música dos Estados Unidos, mas que foi bem bacana ter tido a experiência de presenciar na minha cidade.
A nova sede do DoSol coloca essa experiência de apresentações para pequenas audiências - a casa suporta 60 pessoas - em outro patamar, ao inaugurar uma sala confortável, bem localizada e, mais importante, com uma sonorização impecável.
Eu acompanho atentamente as ações do DoSol, seja como artista ou como público, desde as primeiras iniciativas do então selo, e comemoro as conquistas e boas ideias de Ana e Foca. A quantidade de ações e programações relevantes que a cidade deve a eles nesses 20 anos de atuação é enorme. Sempre fico admirado como além da quantidade de iniciativas, os dois parecem ter controle de cada etapa da gestão dos projetos que põem na rua. Mais recentemente venho observando uma preocupação mais explícita com o léxico em torno das ações que desenvolvem. Na divulgação do último Festival DoSol vi repetidas vezes a menção à preocupação do festival com a memória, o que se refletiu na escalação de nomes como João Donato e Kátia de França para a programação de 2022. De um tempo para cá, seja em entrevistas, em postagens para redes sociais ou nos vídeos gravados para o impressionate DoSol TV, vi muitas vezes Foca utilizar a expressão "fã de música" para se referir ao público das iniciativas do DoSol. Consigo perceber intencionalidade no uso de uma expressão como essa, que na minha ótica passa pela tentativa de se reforçar o senso de comunidade entre o público interessado nas iniciativas do combo cultural.
A impressão que fica dessa minha primeira ida enquanto público à nova sede cultural é de que o espaço foi formatado para servir a fãs de música. O horário em que os shows por lá têm iniciado (por volta das 20h), a duração (cerca de 1h) faz das apresentações que têm acontecido lá muito mais oportunidades para fruição de música do que propriamente uma balada ou programação noturna aleatória.
Do dia 27 de janeiro, sexta-feira, o SeuZé também vai se apresentar por lá. Os ingressos estão à venda aqui. Bora?
Uma dos virais de Instagram de que mais gosto é quando todos passam a postar a suas estatísticas de músicas ouvidas geradas pelo Spotify, Apple Music e afins. Acontece que no afã de ter engajamento antes das festas de fim de ano, esses serviços costumam limitar os dados anuais até fins de novembro. Para pessoas que como eu vêem diversão e têm uma pequena obsessão com a precisão desses números, esse limite incomoda.
Desde pelo menos 2020 voltei a usar mais assiduamente o saudoso Last.fm e tenho me divertido bastante explorando a quantidade de dados que o serviço gera. E o mais legal: não apenas a cada dezembro, mas ao longo de cada ano é possível ter acesso a estatísticas parciais do que se ouviu. Abaixo um resumo das minhas estatísticas para 2022.
Resumindo as estatísticas: como em 2021 e 2020, Jorge Drexler esteve sempre presente nas minhas audições. Tinta Y Tiempo foi realmente o meu álbum favorito de 2022. As gratas surpresas foram Bala Desejo - cujos integrantes eu já acompanhava em seus outros projetos e Moons. Algumas entradas que aparecem nos meus rankings são meio que ossos do ofício. Foi o caso de Shiny Happy People, do REM, que eu ouvi bastante pois a música entrou no repertório da Banda Café. Fiquei obcecado por "Água", de Djavan, após ouví-la numa versão de Mônica Salmaso e Vanessa Moreno. Linda canção, que este que escreve ainda não foi capaz de executar bem ao violão.
Tem sido bacana brincar com essas nerdices sobre os meus hábitos de escuta musical. Mais para a frente pretendo escrever um post em que explicarei quais aplicativos, configurações e equipamentos eu utilizo para ouvir música.
***
Desde 2016 venho listando aqui no blog as minhas estatísticas de músicas e discos ouvidos. Os anos anteriores ficaram assim: 2021, 2020, 2019, 2018, 2017, 2016.
Todos as estatísticas anuais estão reunidas aqui.
Mais uma vez Haruki Murakami integrou a minha lista de lidos. 2022 foi o ano em que descobri Alberto Mangel e a sua escrita envolvente sobre livros e literatura. Também enveredei por algumas leituras de obras de críticos de música como Luiz Felipe Carneiro e Ricardo Alexandre, descobri a obra do chileno Alejandro Zambra e li o meu primeiro Philip Roth, além do primeiro não-ficção de Paul Auster.
Mantendo a tradição, segue a relação de livros lidos ao longo do ano, com alguns comentários sobre os títulos que mais me chamaram a atenção:
A Marca Humana
Philip Roth
Minha primeira experiência com Philip Roth. Lançado em 2000, o livro do autor parecia antecipar reflexões sobre o que hoje a gente chama de cultura de cancelamento e colorismo. Outro aspecto latente em toda a obra é a questão das identidades fragmentadas, problematizada na trajetória do protagonista Coleman Silk.
A Invenção da Solidão
Paul Auster
Aqui Paul Auster reflete sobre a sua relação com o pai ao longo dos tempos, logo após a morte deste e ao se ver precisando lidar com as lembranças materiais e memórias afetivas que surgiam à medida que explorava o apartamento do pai, agora desocupado.
Encaixotando minha biblioteca
Alberto Manguel
Conheci esse livro através de indicação na newsletter de Gaía Passarelli. Na obra, Alberto Manguel faz uma série de reflexões sobre livros, literatura e crítica literária, enquanto tinha que lidar com o encaixotamento da sua volumosa biblioteca, ao se ver na situação de precisar se mudar de uma ampla casa no interior da França, para Nova York.
Com Borges
Alberto Manguel
Borges perdeu a visão aos 55 anos, em consequência de uma condição genética. Em razão disso, passou a só ter acesso ao conteúdo de livros através de amigos com quem contava como leitores. Alberto Manguel foi um deles e esse pequeno livro é um delicioso relato do período em que Manguel conviveu com o autor de O Aleph.
Four Thousand Weeks: Time Management for Mortals
Oliver Burkeman
Há pelo menos 10 anos venho me interessando muito sobre discussões a respeito de produtividade e o seu entorno, de aplicativos para gerenciamento de tarefas a abordagens como o GTD. Após um aumento considerável em meus níveis de ansiedade, problematizado em sessões de terapia e durante a leitura de Sociedade do Cansaço, de Byung-Chul Han, passei a ter um entendimento mais cético em relação a essa busca por produtividade. O livro de Oliver Burkeman traz reflexões inspiradoras e convincentes sobre o tema.
Lado C: a trajetória musical de Caetano Veloso até a reinvenção com a Banda Cê
Luiz Felipe Carneiro e Tito Guedes
No piloto do excelente podcast Discoteca Básica, Ricardo Alexandre sugere alguns trabalhos de jornalismo musical a se seguir. Dentre essas sugestões está o canal Alta Fidelidade, no Youtube, de Luiz Felipe Carneiro, autor do livro.
A obra foca no período em que Caetano trabalhou com a bandaCê, no Cê, Zie & Zie e Abraçaço, mas também aborda a experiência do compositor com outras bandas como a Black Rio e a Outra Banda da Terra.
Em relação à trilogia lançada entre 2006 e 2012, fica a constatação da minha caretice e ignorância no momento em que ouvi os dois primeiros discos. Ouvi bem pouco o Zie & Zie e gostei de imediato dos outros dois, apesar de ter recebido com estranheza a crueza e minimalismo dos arranjos de Cê. À época eu interpretava aquela proposta estética mais como limitação dos músicos que acompanhavam Caetano, do que uma escolha intencional e calculada. O cuidado que o livro teve em apresentar as trajetórias individuais dos integrantes da bandaCê trouxeram um contexto que me permitiu compreender melhor aqueles trabalhos.
Cheguei bem a tempo de ver o palco desabar: 50 causos e memórias do rock brasileiro
Ricardo Alexandre
Livro delicioso de Ricardo Alexandre, do já mencionado Discoteca Básica. Aqui o autor faz um relato bastante pessoal da sua trajetória enquanto crítico musical de veículos como a Bizz e Estadão e de como a sua própria carreira acompanhou as flutuações da indústria fonográfica entre o começo dos anos 1990 e o final da primeira década dos anos 2000. Também vale por várias histórias de bastidores de bandas como Skank, O Rappa, Los Hermanos, Pato Fu, Raimundos e várias outras.
Caçando Carneiros
Haruki Murakami
Após o anoitecer
Haruki Murakami
Antropoceno: notas sobre a vida na Terra
John Green
Falso Espelho
Jia Tolentino
Cidade Aberta
Teju Cole
O Efeito Rosie
Grame Simsion
Bonsai
Alejandro Zambra
A Vida Privada das Árvores
Alejandro Zambra
* * *
Desde 2016 venho listando as minhas leituras anuais. Veja que livros foram lidos por aqui em anos anteriores: 2021, 2020, 2019, 2018, 2017, 2016.
Todos esses compilados anuais estão reunidos aqui.
Watched on Monday January 9, 2023.